Translate

quinta-feira, 31 de agosto de 2017

A sombra caminhou na calçada fria, e eu a segui de longe,
Temia o sol de douradas crinas aos galopes de bicho selvagem,
Na porta do supermercado vendia-se amor aos pedaços, a preço de promoção,
Falta-me sabor à memória, o gosto adocicado de nacos de bala de coco,
Não lembro se algum dia provei o presente enfeitado em laços de fitas, 
Os girassóis roxos retornam do campo na direção contrária ao sol.
A vida declina, a minha sina é seguir o amor, não comprei da liquidação, parecia ter cheiro de coisa passada,
Mas hoje tudo é assim, a lua, os pardais, as estimas, vergam-se às urgências, ao imediato, nem se tem tempo de sentir os sabores,
Os cheiros exalam-se sem os olfatos,
Os temperos sem as salivas,
Os beijos sem as bocas,
Recuse-me a esse tempo de telefone de emergências,
O sofrimento expresso, sou da velha laia, sofrimento de amor deve ser bem cuidado, se dado ao abandono, esfria sem ser provado,
Na sala de espera, a atendente de cabelos longos me olha de soslaio,
Faz-me uma proposta com os olhos, mas uma oferta sem garantias,
Há dias em eu que me entrego aos fatos, mas hoje ainda sigo as sombras,
Dizem que fora dos limites da cidade, tudo é perigosamente voraz
O amor brilha intenso sobre as casas da terra morta
Mas sigo a intuição de que em terreno de cachorro louco, os lobos não fujam da lua,
Aprendi que onde o amor não brota no chão, para senti-lo é preciso uivar nos telhados
Charles Burck
Os olhos das virtudes galopam,
Deveríamos ser únicos, extensões associadas por afeições,
A vida em forjas azuis, quadrúpedes de duas patas,
Uma cidade precisa ser domada e eu domesticado,
As velhas raposas ganhando asas e as cobras com capas de super heróis
A falsidade atua em palcos armados, aplausos que ecoam nas velhas paisagens,
Somos fadados ao fracasso,
As ideias gotejam nas narinas e nas esteiras rolantes,
Consequências de nossas habituais tendências ao desastre,
Fomos derrotados antes da luta, a labuta é a consequência do ato automático de vivermos, autômatos fingindo emoções
O amor foi exumado, a autopsia do cadáver a ser velado entre os dias mais difíceis
Como uma flor num vaso simbolizando a beleza vazia, ou uma fera de olhos atentos
A morte que nos espia esperando o bote final.
Charles Burck
Conserta o vazo quebrado, as flores amarrotadas
Ninguém sonha duas vezes o mesmo sonho
Vou me banhar no rio dos meus devaneios,
Antes que ele pare de correr,
Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio
Nem ama duas vezes a mesma mulher
Eu amei três vezes num único sonho,
Tudo deriva de mim,
E a circulação é um movimento infinito
Tudo indo em direção ao coração
Nascer dói, viver dói,
Morrer não
Charles Burck

O causo do Menino Aluado
Cruz credo o menino aluou, despachou para lugar incerto o cérebro e passou a viver de ser sem responsabilidades, a comadre arrancou os carrapichos da bainha da calça, uma luz divina que ensaia Ave Maria de Gouniout, traduzindo do latim, Mãe amada cheia de graça, de asas plenas de cobrir os filhos perdido de ti ecoou do nada. O padre dava conta da falta de batismo, o Onofre do bar, que era filho de lobisomem e mãe desconhecida.
Mas o guri evocava as provocações do inferno logo seguidas das devoções de arrependimentos, aos frios tomado tremia feito vara verde, e a mulherada orava chamando a salvação.
Dai-nos a vida que há de ser, mas se eu for tomado de insanidade que seja de me perder em você, gritava o poeta sem orientação, abstraído do rumo que se dava ao menino pagão.
Tomado de um amargor mais profundo a boca exacerbava o que vinha da dor, a dor mais doida, processada nos recônditos da alma traz a tona um certo furor, mas não conceda a ela mais que cinco minutos de fama. Tudo é rito de passagem, tudo é como aguaceiro que explode em pingos largos, mas o molhado seca rápido depois que passa, tudo passa, eis a mim o que interessa, tudo passa.
Mas com o menino não passou, e ele deu de largar vidências e previsões de deixar Nostradamus a escrever bilhetinho sobre o futuro.
Primeiro falou de Zé José, do cometa que cairia sobre a sua casa, Zé debochou e dormiu de janelas abertas para ver o céu, aconteceu na madruga de noite límpida, quando um açoite queimou o firmamento e esmigalhou todinha a casa tosca e o anexo de fazer farinha. O Zé virou papinha de macaxeira e nem a caveira de grandes orbitas sobrou para mostrar surpresa posta.
Na natureza volátil de todas as coisas, Jacobina mulher devotada e filha da Maria lascou de soltar a sangria da coisa perseguida, não para um, nem dois, mas para os homens da cidade inteira, tudo conforme afirmado pelo menino aluado. E a fama dele ganhou sertão adentro, até que chamaram Jão de Maldonado, o ermitão que tudo sabia, e ele deu feições à história, dizendo que era um esboço, coisa precária é provisória, que seria de inútil procurar a cura para coisa falseada, pois a cura só de dá em doenças de fato, não em armadas loucuras de pinga ventos. Que logo ao lhe fosse mostrado o diagnóstico da coisa forjada que o menino daria laias a outros caminhos fazendo de melhor proveito a juventude ainda em flor. tudo forjado na imaginação de um menino sem prendas, mas o menino aluado cantou sete noites seguidas, uma Ave Maria de entorpecer a alma de nostalgia e a cidade chorou Maria até a ultima lágrima que havia a ser chorada.
E o menino aluado enfrentou Maldonado e lhe falou da menina de quinze anos por ele engravidou e abandonada ao léu, na porta do Bordel do Beija Flor, virou moça falada, disse também de cada mal feito à sua avó Maria que se entristecia quando ele lhe roubava os caramingualdos salários frutos da aposentadoria dela na fabrica de charutos. Falou dos seus doze irmãos, nome a nome na ordem seguidinha de idade e destino, contou dos 50 contos de réis que ele roubou de Amarildo, o cego, perdido na estrada indo para a Feira de Caruaru. Depois disse mais, que ele tinha uma válvula cardíaca arruinada, que possivelmente em menos de uma semana se daria uma derramação de sangue quando a veia estourasse. Maldonado não esperou o menino aluado repetir, pegou o primeiro ônibus translado para a capital do estado e buscou o melhor doutor, no melhor hospital da cidade.
Charles Burck
E o mar se abriu ao oceano,
Do desconhecido, apenas o amor não teme,
Escreveu teu nome a bico de pena e repetiu mil vezes
Repetição atrai de modo irresistível a órbita da sintonia,
A energia que antes mal passava por aqui agora se expande 
Como atrações criadas entre dois astros que nunca se viram, a união de dois corpos alimentados ao pão das estrelas e à via láctea de leite,
À tua pele gera o contato do arrepio, a tez mais apropriada que encontrei,
Há um instante quando tudo se define,
sente de mim a vontade
Sente a verdade em mim
As mitocôndrias transformando as células que se submentem ao julgamento dos tempos,
Arde a razão, mas a natureza é volátil, e a minha alma espreita a tua através dos tempos,
A surpresa nada tem de habitual, os teus sorrisos quase sempre, ainda que das janelas de criarmos novidades, eu os chame,
Assim a rede se define ao momento que se constrói, e o peixe atravessa o tempo no passado a nados que nem havia antes,
Apenas no sentido da memória eras tu na minha existência, fomentado os passos que daríamos juntos
Antes até que existisse o mundo
Charles
Burck

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

A pedra é amiga do silêncio, mas fala, tem um choro calado, mas dolorido por não poder ser partilhado,
Faz tempos que eu te olhos assim abismado, porque eu não soube como dizer,
O mar azul adormecido, uma língua seca de beijos
Uma imagem refletida nos céu azulado
Ah, admito eu ainda não sei ler na alma,
E ainda no outro dia olhava para Van Gogh que me olhava,
A timidez é um entrave, pois distorce a palavra
Aquele em que uma mulher lê um livro na solidão da sua concentração é mais feliz
Entro e saio de mim, às vezes trago coisas novas, mas na maioria das vezes mais perguntas,
O efeito de não saber onde me encontro, dentro e fora, na fronteira não delineada, a luz se manifesta como nascida do homem,
Escrevi um dia que não sabia de nada,
Agora sei que não sei



Charles Burck 
Thomas Danthony

O causo da língua poética


Que língua é essa que não para, quando preciso calar o tempo,
Depois ouvi os teus passos de dança, a um passo dos meus,
O amor é comparsa de algumas armadilhas, repetia o canto desafinado no disco arranhado
Neste ensaio de vida, a dois passos de nós todo cuidado é pouco
são preciso ouvidos atentos
O poema muitas vezes come a língua dos poetas, numa inversão de valores, o abstrato de endureceu nos prédios espelhados onde os andares não falam entre si,
Não quero minha cabeça imortalizada numa praça qualquer, o prefeito fez um busto de Shakespeare com a orelha decepada e um tampão de olho cego. Creio que ele quis numa homenagem embutir três artistas
Vida de desditas prefiro os artísticos instantes desatinados da tua língua safada, sem nenhum argumento,
O serpentário apareceu no lugar errado do céu, mas cada ato sempre significa alguma coisa, do rio, só me lembro de ter amado as margens que iluminadas pelas luzes flutuantes pareciam serpentes de papel coloridas vendidas nos parques de diversões
Bons tempos sequestrados às lembranças, quando era possível caminhar pela cidade sem ser molestado, acompanhado dos fantasmas de alguns escritores interessados em trocar ideias,
Hoje fazem-me falta as ruas que me falavam de sua lendas e suas calçadas gastam pelos pés que passaram,
Não se faz mais vidas ao caminhar dos dias, tudo se apaga dez minutos antes, essa indefectível maneira de sentir a vida vai nos carcomendo, nos instilando uma amargura de uma venenosa oratória.
Já não vejo os poemas nas praças namorando abraçado, ou os estandartes nos postes do bairro, as domingueira de bilhetes passados nos alto falantes do circo
As magoadas erudições são os gritos nos muros, o gosto de dialogar reduziu-se à língua insistente da minha namora, enchendo a minha orelha de um acalanto,
Os poemas, dizem, são extensões do que somos. Não sei, me diz ele que e eu estou perdendo a ternura

Charles Burck 



Os olhos as virtudes galopam,
Deveríamos ser únicos, extensões associadas por afeições,
A vida em forjas azuis, quadrúpedes de duas patas,
Uma cidade precisa ser domada e eu domesticado,
As velhas raposas ganhando asas e as cobras com capas de super heróis
A falsidade atua em palcos armados, aplausos que ecoam nas velhas paisagens,
Somos fadados ao fracasso,
As ideias gotejam nas narinas e nas esteiras rolantes,
Consequências de nossas habituais tendências ao desastre,
Fomos derrotados antes da luta, a labuta é a consequência do ato automático de vivermos, autômatos fingindo emoções
O amor foi exumado, a autopsia do cadáver a ser velado entre os dias mais difíceis
Como uma flor num vaso simbolizando a beleza vazia, ou uma fera de olhos atentos
A morte que nos espia esperando o bote final.


Charles Burck 

A sombra caminhou na calçada fria, e eu a segui de longe,
Temia o sol de douradas crinas aos galopes de bicho selvagem,
Na porta do supermercado vendia-se amor aos pedaços, a preço de promoção,
Falta-me sabor à memória, o gosto adocicado de nacos de bala de coco,
Não lembro se algum dia provei o presente enfeitado em laços de fitas,
Os girassóis roxos retornam do campo na direção contrária ao sol.
A vida declina, a minha sina é seguir o amor, não comprei da liquidação, parecia ter cheiro de coisa passada,
Mas hoje tudo é assim, a lua, os pardais, as estimas, vergam-se às urgências, ao imediato, nem se tem tempo de sentir os sabores,
Os cheiros exalam-se sem os olfatos,
Os temperos sem as salivas,
Os beijos sem as bocas,
Recuse-me a esse tempo de telefone de emergências,
O sofrimento expresso, sou da velha laia, sofrimento de amor deve ser bem cuidado, se dado ao abandono, esfria sem ser provado,
Na sala de espera, a atendente de cabelos longos me olha de soslaio, Faz-me uma oferta com os olhos, mas uma oferta sem garantias,
Há dias que me entrego aos fatos, mas hoje ainda sigo as sombras,
Dizem que fora dos limites da cidade, tudo é perigosamente voraz
O amor brilha intenso sobre as casas da terra morta
Mas sigo a intuição de que em terreno de cachorro louco, os lobos não fujam da lua,
Aprendi que onde o amor não brota no chão, é preciso uivar nos telhados


Charles Burck 

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Choves-me em frias manhãs,
De me molhar até os ossos
O cais onde as almas soçobram,
onde o mar nos carrega para longe
Como se as primaveras tivessem perdido o tempo
Longe no berço dos sonhos busco o repouso,
Mas os posou são difíceis quando os ventos são fortes
Charles Burck

Por caminhos não percorridos do vento que mexe na sua saia,
Por demasiado tempo alimentei em mim essa harmonia de admira-la,
Precipícios de prestar atenção aos amantes,
As mãos atentas de cuidar dos caminhos
Debaixo da saia dela um mundo de intrincados bordados,
Girassóis que se aquecem ao sol, carroceis meus de crianças
A flor de preencher as lagunas em ostensiva vida,
Linhas de costurar assuntos em uma caixa com botões e sorrisos
Aqui, a sós, longe das desordens do mundo, é onde me deito
Onde me envolvo das magias aromáticas, dos discursos de nada querer saber,
Só trocar abandonos de estar no sossego dos embalo dos corpos
Bem distante dos preceitos, das formuladas regras, do absoluto
Finquei na porta da casa um aviso,
Definindo o meu estado de alma, entregue à vida que se revela ainda que tudo seja restrito
Decido que hoje é um dia só meu,
Legados e tesouros abertos, tecidos de desnudar as vestes,
A vida e os seus dentes brancos, sal dos ossos, o mel da pele,
Debaixo da tua saia há a espera por mim,
Onde a maré vaza, à beirar das praias mansas onde crescemos juntos, onde o sol penetra corpos de sereia
Em beijos sorvidos de semente de alga brotando do tempero marinho
Escamas atraídas feito imãs de sal
Charles Burck

O causo das águas encantadas
A cigana dança chamando a lua, o pandeiro de fitas coloridas e o vestido azul adornado
Sou um menino abusado que admirado a olhos escondido no mato
O riacho ficou amarelado, foi o Saci que fez xixi na água, Jandira não gostou, mas ponderou que é só um menino levado, não tem parte com o diabo.
As águas são parte de mim e sempre me visitam em sonhos, águas límpidas, cristalina de se ver o fundo, ou revoltas feitos ninhos de garças azuis preguiçosas, como sonhos decifráveis de quem deve algo ao mar,
Vi tormentas de águas a voarem pelos céus, e ondas a baterem nos rochedos num eternos conflitos, eu me vejo como um pequena concha entre as fúrias da vida. Dá-me serenidade na vida meu Burck Pai das Aguas,
Venha mergulhar comigo e perseguir sereia, roubar escamas da cauda de luz cintilantes e tocar-lhes os bicos arrepiados dos seios.
O que a ti escrevo diante do mar, são contos de saudades azuis turquesa, é o que me resta do arco iris que murchou, posso senti-la onde as ondas descansam aos meus pés, e sorrir a cada lembrança
Esse caminho é mutuo, mas por que tu me chamas sempre se eu não sei a tradução dessa canção carregada nas marés, onde quase sempre o meu barco se perde
Vovó Georgina sentava á beira do rio e brincava com iluminadas pedras vermelhas, dizia que eram contas de meninas deixadas por Deus para marcar o lugar sagrado de fazer pedido.
Fiz um pedido para consertar um pé de ipê roxo que estava morrendo, um braço quebrado do meu pai. Em dez dias estava sarado o ipê e um mês depois ele floriu de quedar os galhos. O prefeito Godofredo cortou a árvore, matou cinco filhotes de viuvinha, uma cambaxirra e um curió, mas é se faz à vida não
fica sem respostas , e ele foi tomado de uma coceira de deixar feridas expostas manchas roxas e penas a sair pelas ventas, até dar a vida a uma centena de passarinhos.
Aqui da minha janela sobre o mar, o silêncio foi quebrado pelos barulhos dos pentes de Iemanjá a pentear os cabelos, cabeleira de cachoeira de espumas douradas, ao chegar a noite, da bordas as rendas ao vestido dela, as estrelas faíscam e brinca de contas e vagalumes que entram floresta adentro pela escuridão.
Quando morre o brilho, fica a réstia de luz que some mansamente
As sombras deslizam uma a uma para longes.
O teu cabelo a murchar na minha mão.
O rio lembra os teus cabelos escuros que tento tatear nos reflexos de uma luz branca,
Sem saber que hoje tem festa da cigana da lua cheia

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Perder-ser
De tudo que parecia sinais, nada veio,
Às vezes não basta estarmos atentos, é mais,
É velar o sentimento como quem cuida de um rebento,
Não precisa contar as estrelas, nem entender os ventos,
Às vezes o amor dá voltas longas perto de nós como apelos do mar,
Demora-se a esperar até que o entendamos,
O coração é um campo verde de espigas douradas,
Que quase nunca colhemos, deixamos as dores seca-las
Esfarelarem-se às pragas dos sofrimentos,
Lamento tanto ver o amor estragado, enjeitado, as semente nos bicos do corvos
Como um longo ensaio filosófico sobre amarguras,
Mas tudo tem cura, ainda há tempo, deixe a banca de debates,
Ajeite os olhos ao mar, abra as janelas de entra vida,
Cada ferida há de sarar, não conte nada a ninguém,
Mas tenho um recado dele a você,
Reserve um espaço ao seu lado que ele logo vem
Charles Burck
O causo da menina em fogo

O cão ladra e o bode fede, a catinga do enxofre alastrou-se no átrio da igreja, pegou fogo nas cortinas do confessionário e uma chama vermelho e amarelo dançou feito azougue na porta da casa de Dona Helena.
O céu adernou e o mundo soçobrou aos ventos, coração desatento colhe o que sobra
Versei mi vezes sobre o amor e ele nem ligou, comeu sopa de queijo coalho com couve flor e mungunzá de milho novo, a quem tem bons dentes qualquer carne velha serve, mas a direção da razão pede filé mignon bem passado, se possível feito na manteiga..
Já fiz experimento com fórmulas de arnica e pimentas sortidas, urtigas de folha grossa e sal de rosa, uma mandinga de chamar chuva, choveu, choveu, mas alagou tudo. O sertão precisava de chuvas e ficou muitos anos sobrando água.
Já achei diamante à flor da terra e esmeralda no riacho de águas turvas, mas o amor é um tesouro feito ouro e água benta.
Padre Zezinho fez novenas para as meninas perdidas, as moças adotivas de Santo Antonio, algumas apareceram paridas e deram culpas ao santo, mas Padre Zezinho sempre desconfia do tal demônio Aleixo, de mangueira torta, cabeça arroxeada de sangue pisado e calças frouxas, que corre pelas ruas do povoado no dia de São Valentim. Eu fiz um riscado no fundo do quintal da Helena, a filha anda atentada, as coxas roliças assadas de esfregar uma na outra. A binxidiba esfogueada, eletrificada de acender a casa toda sem precisar de energia elétrica. Ave Santa Madona, a energia é tanta que a moça revira os olhos, pode parecer que possessão, mas não é não, é só fogo solto, precisão.
O manacá para dar semente precisa dar a flor, mas a rosa inchada, de febre tomada precisa ser molhada de hora em hora, óleo de menta e quinado melhora, mas tenho receios que combustível sobre chama possa dar labaredas de torrar a piroroba. A pixundeba vaza tanto que as águas de alvura plena, escorrem pela cama, ganha a rua e formam riachos, logo acho que precisara de barragem de contenção, mas o diacho é que desfolhei um cesto, uma maçaroca de folha de aipim, dizem que é bom para a amansar excessos de escorrimentos, mas e moça prefere a mandioca com casca e tudo. Cruzes deuses dos desassossegos, não sabemos mais o que se há de fazer, mas por certo o melhor dos conselhos é da bisa Açucena, com seu sorriso maroto e atento que diz: porta fechada não entra vento, abram a janela de espiar dentro e deixem entrar o sereno.
Nestes tempos de lua cheia e estrelas fazendo riscados, as metáforas de assentar rachadura em carne viva, creio que o tal do sereno é o Raimundo, menino bom e esperto, que por certo, pôs a cabeça de olhar janela por dentro, mas não é que andor não desandou, a menina até serenou.
Pau de bate em doido não escolhe lado, hoje enfim dormirei sossegado ao lado de uma boa menina, é por falar em amor, feche os olhos e conte até cem, se ele não vem e você sentir algum roçado, faça uma oração corrida, vire de lado, pode ser o tal Aleixo se assanhando nos seus costados.
Charles Burck


A poltrona laranja
Sentado na poltrona laranja diante da janela viajava em pensamentos
Do horizonte ao teto, do chão à luminária vermelha
Pendida como um sol dentro da sala, 
Um céu, apenas de difusa luz encarnada,
É o que eu tenho agora, quando nos temos à distância,
No peito o coração pendurado, a ler os teus olhos
Que nem sempre a mim se mostraram,
Poemas que eu arrisco coletar nos mistérios de ti
Deixa-me sonhar os mitos, os deuses loucos sem perguntas elaboradas,
Deixa-me adormecer no alheio mundo sem cotas de tempo
A vida alongada nos desenganos de coisas perdidas,
Que não te assustes comigo, apenas penso que sonho,
Mas no colo da poltrona cabem bem mais que um
O convite formulado ficará pulsando no teu seio,
Um anjo sustenido infernizando os teus pensamentos
Uma quase vontade de tudo largar e um natural fenômeno de se dar ao amar
De se grudar no sacro bendito e voar ao aconchego da poltrona como asas angelicais
Esse sabor de experimentar-me melhor a invadir-te as veias e o cérebro,
Tão veemente álcool criando azular de céus e das estrelas,
Gozos a cunhar sobre abóbadas celestes, lanternas japonesas,
Amor sem pesadelos.
O pior agora passou, sorria então,
Todas as mortais angústias vencidas, as rimas sem conexões,
A maldição do poema, tudo passou ante os meus olhos,
A maldade da separação, os pontos de interrogações,
Tudo queimado no bafo do anjo limpando as bocas aos sagrados beijos
Tudo ao conforto da poltrona laranja


Charles Burck


No jorro do joio ficou o trigo perdido
O tempo rapina entre as lembranças do que se perde dos homens
O que verte dos olhos fala tanto, no entanto, você nem me vê,
Quem diria olhar-me apenas nos olhos,
enganam-nos os excessos de imagens, de sons e sombras de longínqua batalhas, 
A nítida recordação do inimigo apontando a seta para nós,
Num exército invisível a localizei por um olhar,
Deste modo tão seu, tão íntimo que só eu sei ler,
O fim nunca é o fim, projetei luz sobre as sombras,
Uma forma tão minha de crer.
Charles Burck
O causo da poetisa morta
Aos pensadores de probas línguas em um cintio pestanejar, hão de palrear sonoros devas de formar versos, como conversas entre pássaros e flores, mas nas cópulas dos florejares um hibisco deu descomedimento, nunca imaginei que desarranjo de flores produzisse poemas, mas as cabeça de esmiuçar as filosofias generalistas adoram jardins de múltiplas flores, e as suas contendas.
Prezo muito a erudição, mas a palavra escrita é mera tradução da magia de ver, a grande busca é procurar ser o mais preciso possível, na impossibilidade nascem as tentativas, as razões das conquistas.
Vejo-me a pelejar na manutenção da proeza da erudição, mas sou sovervo ser do sertão, que assombreia calangos e planteia xique xique para matar a fome, antes a da barriga, depois a da versação.
Conheci um fantasma, toda bem ajeitada na beira do açude da Soledade, era uma alma perdida de poetisa lá do sul. Vestia vestido de chita, que por vezes, transparecia a alma dela, feita de sol. Tinha olhos mais doces que rapadura e por vezes sumiam das órbitas, os cabelos longos feito estradas que se perdem na noite, todos mimados de flores em grinaldas de jasmim. Já buli em estrelas desenhadas nos muros como se no escuro fossem do céu, mas os obstáculos de descrever coisas vivas já são uma limitação, imaginem aparição fazendo arte. Deus procrastinou aquela sina, feito uma pajelança de dar tempo ao tempo de absorver a morte depois da hora prescrita. Conversamos em noite seguidas, prosas, liras e conversações dando o sentido à poesia de antropolatria. O espiritualismo explica, mas o coração mexido não buscava explicações, convivíamos ao que a erudição ligava tempos distintos, sem considerações partidárias, quando não nos importávamos em ser, éramos dois seres banhados pelas energias de um encontro estranho, encantados apenas por fato de estar.
Ela me fez um poema, quatro versos pequenos, aparentemente sem lógicas, mas cada palavra posta na areia da margem do açude empedraram e ainda estão lá para quem quiser ver.
“O poema é a alma exposta,
Palavras que não se consegue proferir,
Deixo a você na forma de afeição,
Versos do que eu não pude lhe dizer”
Considerações vindas da flama do coração por ora me geram ondas instáveis, mas delongadas, penso em Hilda Hist, Florbela Espanca, Adélia, Cecilia e Ruiz, quantas passaram por nós, mas disseram que partiram, eu sei que ficaram, os olhos apaixonados de quem versa há uma verdade cindível ao único fato que importa, eu a vi, para já aqui temos é uma metafísica dos níveis de orar, cabe-nos então, não obstante, examinar as premissas resultantes, da verbalização retórica: passaram, mas que vivem, vivem...
Charles Burck


Tenho medo, às vezes, do mágico, do incrível e,
Às vezes, até das minhas lembranças,
Quando ainda entendia a vida como uma brincadeira
De sentar à beira do princípio das dúvidas como uma peraltice,
A balançar as pernas como numa cadeira de colégio
De não ficarmos preso a nada,
A memória me vem como uma onda varrendo tudo
E me mostra como fiquei frágil com o passar dos anos,
Mais tímido, intimidado com as agrurezas da vida,
Assusta-me saber que nada tentamos,
Que estamos preso ao medo do nada
Posso ainda ouvir o meu sorriso de criança
A reverberar na minha voz indecisa de adulto
Choviam estrelas no mar e corríamos para assistir sem medo de sermos atingidos
Hoje fechamos as janelas
Por lá ainda estamos a tentar pegar uma com as mãos ingênuas e puras
Tenho saudades do afoguear das faces do tanto que tentamos ser
Poeta e musa
Quando quisemos nos fazer escritores de primeiras horas,
Quando mal sabíamos escrever nossos nomes
Hoje ainda vejo os teus olhos a brilhar no semáforo!
A intercalar sim e não,
Talvez... foi uma opção
Por que ficamos lá?
E infelizmente
Por que nada tentamos?...
Por que estragamos nossas chances de ser?
A saudade é uma mentira inventada pelo coração
Uma boia de salvação lançada ao mar da dor ou da solidão
Uma forma do amor não morrer afogado no oceano da desesperança
Charles Burck

Como uma pequena chama subsiste
Aos sopros do vento, nestas noites tão escuras,
Dentro dos olhos desatentos à vida
Caminho num pais sem fronteiras, raras sintonias
Canções que sussurram vozes que eu desconheço, 
Uma terra agreste, de unhas e garras agudas, a surgirem do chão
Estradas de pedras afiadas desenhando a nomenclatura dos dias.
Uma pequena ponte atravessando dois lugares de fuga,
Escrevo para dar forma à vida, saber que vivo,
Escrever como quem descreve o término de um grande amor,
Quando tudo parece irreal, fluídico, intocável,
Um luto de enegrecer o coração, vidrar o sangue, nos retirar a realidade,
Em um tempo de coletar referências, parâmetros, algo a que se apegar,
Um chão firme para os pés, um horizonte ao olhos e uma qualquer vida a ser vivida
Charles Burck
cheval
Mesmo brigados ela lhe ofereceu os seus braços para ele dormir, mas ele se fez de rogado e não quis
Dormiu um sono pesado carregado de pesadelos, despertou na madrugada assustado e correu para os braços dela
Ela fingiu que não viu, mas o acolheu e no aconchego ele se aninhou sossegado, dormiu o sono dos justos, sonhou coisas lindas e amanheceu descansado

Tudo o que eu queria era ser teu poema.
Um poema estranho, escrito por tuas mãos
Sobre a pele das minhas costas
E que me lesses.
Lesses cada dia um pouco, sem pressa,
Digerindo a poesia impregnada no meu ser
Exalando palavras de te querer
E que cada palavra que me dissesse.
Que me soubesses de carne e osso,
Porém tão fundamentalmente lírico
Como uma página inédita
Carregada de tintas, que penetrando a carne
Chegasse ao coração e vazasse como sangue
Tingindo o papel
Lesses intensa, ou loucamente perdida
Como nunca o antes acontecesse, como antes nunca fizestes
Não ao meu jeito de te querer,
Não como eu queria que fosse, mas mais
Mais com a profundidade que rasgasse o papel.
E gritasse como uma alma que nascesse das coisas nossas
Sangrando-me a carne
Charles Burck

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Causo de cobra morta
O sapo bocejou sonolência, o veneno da cobra viajou pelos estertores da veia, Menina feia pelejou, usou máscara de arnica, de lama, de jiló com o urucum, e cerâmica, se aprumou, mas ficou com cara de bibelô, mais dura que peito de armadura
Mas quebrou-se ao primeiro atrito com um homem de coração mais frio que o frio do congelador,
Tem um freio preciso para homem machão, mandacaru tem espinhos, mas se abre em flor, Dona Genoveva já amansou até os chifres do carcamundo, bicho dano de ruim perverso que nem coisa estragada, já capou seis, pretende chegar a uma dúzia,
Perereca em terra de cobra fecha as pernas. Ou não?
Bem, para cada caso um remédio, o meu manifesto já gerou desolação, homem que bate em mulher deveria perder a mão, ou ficar de mão boba feito flor de paçoca, meio morta quando o amendoim não torrou.
Lá pros lados da estrada a coruja já piou três vezes, visgo de jaca no meio das pernas de moça virgem pega o aproveitador pelos desmazelos, mas pinto não é brocha, nem galocha é sapato de passeio,
Um pingo em cima e dois no meio, homem ruim não traz escrito na testa, mas eu já sabotei gente pior, quando avisto um cabra sem tramoia, reconheço pelo cheiro, pelos olhos atravessados, cravo o desconjuro e três padres nossos, a oração de fazer piá caracará, deixar cobra morta
Já fiz demanda em terra santa e ouvi música do outro mundo, sussurros de alma penada e a dama de branco sentada na porta do campo santo,
Mas não tenho medo de assombração, só de gente,
Quem pensa que poemas não servem para nada, eu digo e penso, o miolo do mundo se encontra nas palavras, nos textos que lemos, entre as folhas impressas, nas canções, nos sons, nas imagens refletidas nas águas, nos escritos dos sabugos de milho,
Tudo o que há no mundo pode se expor nos brilhos dos olhos, nas arranheiras boas das violas, mas o mundo é muito mais do que você quer saber dele,
Fico só, tantas vezes de orelha colada no mundo, ouvindo o ruído da terra gemendo, mexendo a sua caçarola de magma.
E sei que há mundo que vive para além de tuas melancolias, dos tuas horas mortas, de cisco nos olhos, das águas que correm do fundo da íris
Já matei passarinho e me arrependo, pagarei cada pena, mas o mundo sabe de mim, o mundo dos que sofrem é porque pretendem fazer de todos os olhos os seus olhos, que todos vejam o mesmo que você, ai coisa besta sô, que mundo mais chato seria.
Ganhei carta de alforria de Deus para não seguir ninguém, mas tem gente abusada que quer fazer dos outros escravos do se jeito de ser e pensar.
Das aberturas das minhas janelas olho o mundo com o dom de ser feliz, a coruja piou três vezes, agora me lembro, mas faz tempo, dizem que é desconjuro, mas no nosso mundo de vivos é fácil morrer, mesmo sem pio, aproveite e com os olhos estenda um lençol florido, para brindar a vida
Eu creio e penso sempre que quem vê o mundo com os nossos olhos, são os que amam, mas dizem que o amor é cego!!
Charles Burck

domingo, 13 de agosto de 2017

Trago-te no olhar, aparição extraordinária
Quantas coisas tateei enquanto era cego,
Imaginei um dia seco, onde as chamas se alastram,
Caminharei por entre o fogo,
E deixarei queimar o meu coração limpo,
Aonde assim me venha a luz da lamparina,
Que me guie até a próxima clareira,
Desse amor certo e genuíno,
Onde de nós o amor faça sentido,
Dê-me a mão, às minhas, às vezes tão exaustas,
Guia-me por essa nova estrada,
Por onde eu vista minha última roupagem
A última

Charles Burck

Vyacheslav (Slava) Korolenkov